terça-feira, 9 de setembro de 2008

Sonhos

Sonhos

(Sons de coletores)

Sonhos de uma vida melhor

De um país melhor

De um mundo melhor

Dia-a-dia corremos

Em busca de sonhos

A procura da felicidade

E a encontramos

Em forma de sorrisos

De gestos de carinho

Ou simplesmente pela compreensão

Seres da luta

Diária luta

Com chuva ou sol

E a cada rua percorrida

O sentido do dever cumprido

E ao final de cada dia

No aconchego do lar

Encontramos razão para

Continuar correndo

E deixar mais bela

A áurea Vila Rica

A Vila dos Sonhos

Bordados em ouro

Cor da minha pela

Em sangue

Cor das minhas feridas

A cada dia a imaginamos

Mais limpa e bela

Como nossos sonhos

Sonhos de vida

Sonhos de luta...

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Bitu

Seu Mané era homem forte, carreiro de profissão. Desde muito moço já era mestre no trato com os animais, amansava cavalos, laçava boi bravo. Dizem que até já enfrentou um estouro de boiada.

Seu maior orgulho foi no dia em que recebeu uma junta de boi pra carreá, todos falam que neste dia seus olhos brilhavam mais que diamante. Foi um carreto pequeno, tinha que levar uns sacos de feijão da fazenda de Seu Levino Raimundo até na fazenda de Totone Lope, só uma junta de boi fazia o serviço. Ah! Mais essa foi a primeira viagem de Seu Mané, o carreiro, era assim que ele gostava de ser chamado. Dizem que durante toda viagem foi cantando “Pisa na Fulo”, segundo ele a música mais bonita do mundo. Carreto bem sucedido entrega pronta, na volta ainda trouxe umas sacas de café, seco e forte, igual seu Levino gostava.

Depois deste carreto, lá se foram pra mais de quarenta anos como carreiro. Trabalhou em diversas fazendas, sempre com uma enorme paixão pelo que fazia. É, mais a idade chega pra todos e um dia Seu Mané teve que deixa de carreá. Por essa altura também muita fazendas já tinham era caminhão e quase que num se ouvia o canto do carro de boi. Carreiro já era profissão condenada a acaba.

Foi por essa época que Seu Mané mudou pra cidade. Comprou uma casinha na Rua Seca do Rosário e mudou com a mulher e os filhos. Ali uns de seus filhos casaram, construíram família e lhe deram netos; outros meninos foram pra São Paulo tentar vida melhor. De vez em quando vinham visitá-lo e sempre a despedida era com lagrimas nos olhos.

Mas Seu Mané nunca perdera o contato com a roça. Sempre era chamado pra ajudar nas festas de casamento dos filhos e netos de seus antigos patrões. Por esse tempo ele se especializou em abater carneiro, e sempre era lhe confiada essa missão nas festas. Gostava de chegar às fazendas ns quatro dias antes, e ali escolhia o melhor dos carneiros. Abatia, limpava,temperava e assava. Todo mundo dizia que ficava de lamber os beiço.

Ele dizia que o segredo era não fazer o bicho sofrer. Primeiro não deixava ninguém da casa ficar por perto, porque se alguém ficasse com pena o bicho demorava a morrer, sofria muito e a carne não ficava boa. E também tinha que ser preciso, uma machadada só e então sangrava o bicho, rápido sem sofrimento.

Em uma dessas festas, casamento da filha de Pedro que era filho mais velho de Seu Levino Raimundo, lá das Peroba, Seu Mané levou um de seus netos. O menino ficou tão alegre que nem sentiu a viagem passar. Fizeram todo o trajeto a pé, pois não conseguiram uma carona. Chegaram de noitinha, foi só o tempo de lavar os pé, janta um pouquinho e dormir.

No outro dia acordaram cedo, era uma quarta-feira e o casamento seria no sábado, e os preparativos para o casamento na casa da noiva já estavam começando.

O neto de Seu Mané ficou maravilhado com a roça, fora criado na cidade, no máximo criava umas galinhas e uns porcos no quintal. Ali tinha de tudo e o menino ficou o dia todo correndo atrás dos bichos. Também levou um galope de uns gansos e umas picadas de marimbondo chumbinho.

Mas se teve uma coisa que encantou o menino foi um carneirinho preto que ele deu o nome de Bitu. O bichinho também gostou do menino, os dois andaram juntos por toda a fazenda e até caíram num corguinho que passava por ali. O engraçado era que o menino pensava que aquele era o temível Rio Casca, contava orgulhoso que vencera o rio, e Bitu berrava como se concordasse com o menino, parecia dizer querer dizer que também era herói.

Foi assim até na sexta-feira. Neste dia foram escolher o carneiro. Iriam abater de véspera para deixá-lo dormir no tempero. Como de costume Seu mane escolheu um dos carneiros mais velhos, que já apresentava sinais de cansaço. Quando estava levando o bicho pro abate, Pedro saiu na varanda e disse que já tinha separado era uma fêmea para que fosse abatida. Falou que aquela é que era da noiva e que tinha que ser ela. Seu Mané tentou argumenta, dizendo que a fêmea criara o pouco tempo e que poderia dar mais cria. Mas o homem não quis nem saber de conversa, disse que o casamento era da sua filha e que a carne da festa tinha que ser a cabra que era dela e ponto final.

Quando e neto de Seu Mané chegou ao terreiro acompanhado de Bitu, percebeu que aquela cabra que ali estava era a mãe do carneirinho. Parecia que o bichinho sabia o que iria acontecer, porque bateu nele uma tristeza sem fim. Percebendo a situação, o menino pediu ao avô que não matasse a cabra. Seu Mané disse ao menino que não poderia. Não em respeito a Pedro, mas sim em respeito a Seu Levino Raimundo, de quem era compadre.

Na hora de abater a cabra, pela primeira vez Seu Mané não acertou na primeira machadada, foram no mínimo umas seis, e parecia que cada uma delas doía mais no velho do que no próprio animal.

Dizem que foi por causa do menino que via tudo escondido com o carneirinho Bitu, outros falam que neste dia foi a primeira vez em que Seu Mané sentiu pena de um animal que abatia.

O que se sabe é que naquela noite, nem Seu Mané, nem seu neto e nem o carneirinho Bitu dormiram. E que nunca mais Seu Mané matou um carneiro.

Alguns dizem que foi um pacto que ele fez com o neto e o carneirinho naquela madrugada. Outros dizem que foi porque naquele dia ele agiu contra seus princípios.